ÁGUA INVISÍVEL

Assisti a uma reportagem num desses canais a cabo que tratava do problema da escassez de água no planeta. Concluía dizendo que as guerras do futuro não serão travadas mais em razão de petróleo, como as que acontecem no Oriente, mas devido à falta de água.

Muitas pessoas não se dão conta de quanto a água é imprescindível a nossa vida.
Aliás, alguns até a veem com certo desprezo.
Preferem uma pinguinha ou um escocês de 15 anos.

Mas é a vida feita de água.
A começar pela Terra, este planetinha insignificante que nos serve de carona a nós todos.
Não é a toa que Yuri Gagarin constatou que a Terra é azul.

E a busca incessante por vida em outros planetas, um deles incrustado em uma das três bilhões de galáxias, segundo o último censo, começa pela constatação de que, nele, um desses planetas, exista água.

Tanto assim que, na semana passada, li na UOL que descobriram argila em Marte.
A comunidade científica ficou feliz não porque vão começar a produzir cofrinhos em forma de simpáticos porquinhos e vender nos cruzamentos de São Paulo.
Mas porque sabem que só existe argila onde existe água.

Coitada da água.
Tem tão pouco e a que tem está sendo irremediavelmente conspurcada com nossos esgotos.
Sem contar o Ganges, na Índia, que vem servindo a séculos de cova rolante.

Mas a água não é apenas a água que vemos no chafariz da igreja ou na piscina do clube.
A água também pode ser invisível, além de insípida, incolor e inodora, como ensinava o professor de ciências do Colégio Salesiano de Lins.

O corpo humano, por exemplo, tem 70% de água.
O Criador disse que somos pó, para onde voltaremos. Só se for como o leite, água em pó. Batendo, desmancha. Ou então a frase dita em Deusês (assim, com chapeuzinho no e), que seria esta a língua do Todo Poderoso, foi mal traduzida.

Não obstante esta imensa porcentagem de água, se a gilete estiver meio cega, na hora da barba, do ferimento sai sangue. Vermelho. Com cheiro, gosto e cor.
E no “por aí”, então?

Você, caro leitor, se é que tem alguém lendo, sabe quantos litros de água são consumidos para produzir um mísero quilo de carne de boi? E um quilo de banana? Ou um quilo de arroz, um quilo de carne de frango, de manteiga ou de queijo?
Não faz nem ideia, né?
É que não costuma fazer palavras cruzadas.

Na revista Coquetel de uns meses atrás, especializada em quebra-cabeças, veio um encarte patrocinado, entre outros, pela ANA, a Agência Nacional de Águas. Está tudo lá. Nem precisei do Google.
Só tive o trabalho de copiar.
São necessários 17.100 litros de água para se produzir um quilo de carne de boi, 499 litros para um quilo de banana, 3.700 litros para um quilo de carne de frango e 5.280 litros para um quilo de queijo. Mas, tem mais, diria o locutor do reclame das Facas Guinzo. Para produzir um quilo de arroz são necessários 2.500 litros de água. Se não fosse politicamente incorreto eu diria que os chineses estão, como dizer (?), ah, sim, estão ferrados neste quesito.

E a gente continua meio que ignorando a água.
Pensamos em energia, transportes, saneamento, saúde, agricultura, até em lazer, esquecendo que tudo isto depende de água e água boa.

Continuamos, em especial os governantes, pensando em tudo que envolve água e nela não, aliás nela nada, literalmente.

Como se fosse invisível.
Pode ser.
Mas, quando a água acabar, não adianta furar um
poço, como no samba de Zé Quéti.
Hão de perceber que estou advogado em causa
própria, porém justa.
E a favor de todos.

 

Sergio Antunes

sergioantunes@ig.com.br
É procurador autárquico
do Estado de São Paulo,
exercendo suas funções no
DAEE Departamento de
Águas e Energia Elétrica.